"É Preciso Ver os Anjos"
Agnes estava parada no meio da rua. Distraída, olhava para os dois homens encaixando as últimas telhas na cobertura do posto de saúde.
- Bom dia irmã!
Ela virou-se.
- Bom dia - respondeu ela ao estranho - Em que posso ajudá-lo? – perguntou.
- Disseram-me que é aqui que fica o posto de saúde...
- Ah, sim, é aqui mesmo... Quero dizer, ainda não está pronto. Estamos na fase final das obras e ainda faltam muitas coisas... Inclusive o médico – disse em tom de brincadeira.
- Então, permita-me que eu me apresente: Eu sou o med... sou quem vai clinicar aqui – informou ele – Fui enviado pela prefeitura de São Martinho.
- Deus seja louvado! – bradou Agnes em alegria – Tinha esperanças que o prefeito atendesse nosso apelo, só não esperava que fosse tão rápido!... O posto nem mesmo está pronto... Faltam camas, equipamentos, tudo...
- Eu posso entrar para dar uma olhada?
- Naturalmente que sim!... Venha, eu vou lhe mostrar tudo.
Agnes acompanhou-o até o interior do prédio. Mostrava cada sala, cada detalhe; descrevia cada etapa da obra com orgulho. Falou dos planos, das dificuldades, das conquistas... Leopoldo ouvia tudo atento e um tanto emocionado. Repentinamente foi tomado por uma felicidade interior. Agora sabia que tinha feito a escolha certa. Pelo menos por enquanto.
- Francamente, irmã, estou impressionado... É quase uma pequena clínica!
- Não avalia como fico contente em saber que o senhor gostou Doutor... ainda não sei o seu nome...
- Chame-me apenas Leopoldo... Eu prefiro assim.
- Eu entendo. É tão jovem, deve estranhar esse tratamento formal... Eu sou Agnes – apresentou-se.
- É um prazer conhecê-la, Agnes.
- Seja bem vindo Leopoldo.
Agnes simpatizara com ele. Pareceu-lhe, à primeira vista, uma pessoa humana, despretensiosa e de caráter. Alguém com quem ela poderia contar daqui para frente
- Estou tão feliz com a tua chegada que me parece até que caiu do céu!
Ou do inferno – pensou ele. Ao ouvir essas palavras, sentiu uma angustia por dentro; não tencionava, de maneira nenhuma, enganar aquela gente humilde. Contaria na primeira oportunidade, só tinha que esperar um pouco para fazer valer a confiança que depositariam nele. De outra forma, não importaria o que dissesse, o tomariam por charlatão.
- Agora, quero que venha comigo – pediu Agnes indicando o furgão estacionado do outro lado da rua – Quero lhe apresentar uma pessoa que ficará tão feliz quanto eu pela sua chegada.
- Quem é ele?
- Não é “ele”, é “ela” – informou Agnes.
- Uma mulher?
- É minha irmã carnal. Ela é a maior responsável por todas essas mudanças maravilhosas em Redentor. Vai gostar dela, pode apostar!
- Como ela se chama?
- Ingrid. Ingrid Vankovsk.
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Agnes estava certa. Leopoldo realmente gostou de Ingrid e ela dele. Ficara tão feliz com a chegada dele que propôs um almoço em comemoração. Sara chegou da escola e os quatros sentaram à mesa. Conversavam animadamente, faziam planos quanto à inauguração do posto:
- Tenho algumas economias, posso ajudar na compra dos equipamentos – dizia Leopoldo.
- É muito generoso – elogiou Ingrid – Mas prefiro que use suas economias para se manter por uns tempos. Precisa providenciar uma casa para morar, uma vez que decidiu ficar definitivamente em Redentor.
- Estou pensando em me instalar lá mesmo no posto de saúde.
- No posto? – perguntou Agnes – Mas ainda não está pronto... Nem mesmo temos uma cama lá.
- Neste caso, está decidido – declarou Ingrid com convicção – Ficará hospedado aqui em casa até mobiliarmos o posto.
- Eu aceito o convite por essa noite – disse ele – Amanhã viajarei para a Capital para buscar minha bagagem...
- Para a Capital? – admirou-se, Agnes – Pensei que morasse em São Martinho...
Ele enfiou uma garfada de comida à boca e pôs-se a mastigar lentamente. Tinha que elaborar a resposta:
- Possuo família em São Martinho, mas há muitos anos resido na Capital onde ingressei no curso de medicina.
- E quando estará de volta? – perguntou Ingrid.
- Em dois ou três dias.
- Traga sua bagagem para cá – disse ela – Eu e Sara teremos muito prazer em hospedá-lo.
Leopoldo perguntava-se como o pai podia ter a coragem de querer apoderar-se de tudo que ela construíra à custa de tantos sacrifícios. Tudo pela ambição mesquinha de engordar ainda mais a sua fortuna. Ele nunca soube o que mais dava prazer ao pai: se o dinheiro ou o poder. Talvez fossem as duas coisas.
Sentiu-se aliviado ao constatar que tinha tomado a decisão certa de não revelar sua verdadeira identidade. Pelo menos nisso o Coronel tinha razão: tinha que permanecer no anonimato; não pelas razões sórdidas que planejara ao enviá-lo para lá, pois dessa, Leopoldo já havia decidido não fazer parte, mas pela vergonha que isso causaria si próprio. Era quase certo que acabariam descobrindo, um dia, mas esperava que até lá, tenha tido tempo suficiente para mostrar suas verdadeiras intenções: lutar lado a lado àquela gente e dar o melhor de si. Era a primeira vez em toda sua vida que alguém lhe atribuía algum valor e ele não perderia isso por nada desse mundo.
Depois do almoço, Agnes voltou a supervisionar as obras do posto, e, enquanto Ingrid se ocupava em lavar a louça, Sara acompanhou Leopoldo num passeio pela cidade:
- Você gosta de ser médico? – perguntou a menina enquanto caminhavam.
- Sim, gosto muito.
- Eu vou ser pintora – informou, ela – Sabe que eu até já dei aulas para as crianças da escola?
- É mesmo?... E quando foi isso?
- Quando não havia professoras aqui. Mamãe é quem dava aulas, e quando ela não podia comparecer por causa das costuras, eu a substituía.
- Mas você também freqüenta as aulas, não freqüenta?
- Eu não perco um dia de aula, se quer! Adoro a escola.
- Você não devia estar em férias letiva? – perguntou Leopoldo.
- Só temos quinze dias de férias de verão e quinze de inverno. É para recuperar o tempo perdido, sabe?... Estamos fazendo dois anos em um. E a idéia foi minha! – gabou-se a menina.
- Foi uma grande idéia, mas não é muito cansativo?
- Um pouco. Mas não se tem mesmo nada para fazer por aqui – disse Sara dando de ombros –... Você sabia que a mamãe está alfabetizando os adultos no curso noturno?
- Não, não sabia.
- Pois é. Agora quase não há analfabetos em Redentor... Isso não é maravilhoso?
- Sua mãe é uma pessoa maravilhosa. Uma mulher de muita coragem. Aposto que você também será, um dia.
Eles caminharam por toda a cidadezinha. Sara o levou às minas e lhe contou a história dos mineiros.
- Meu avô morreu lá embaixo e ainda está lá junto com os outros.
- Você o conheceu?
- Não. Não tive tempo – disse a menina, tristemente – É possível que ainda estivesse vivo se não fosse... Ah, não vamos mais falar de coisas tristes.
- Tem razão.
- Leopoldo... Posso lhe fazer um pedido?
- Um pedido?
- Posso decorar o posto de saúde com minhas pinturas?
- Eu iria gostar muito... O que pretende pintar?
- Ainda não sei, mas tem que haver uma explosão de cores.
- Explosão de cores?
- Sim, muitas cores. Consegue pensar em algo mais apropriado para alegrar os doentes?
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Frei Henrique se preparava para rezar a missa. Consultou o relógio: 6:45h. Àquela hora da manhã de domingo, a paróquia já estaria apinhada de fiéis. Para o frei, esse era o momento de maior recompensa para um sacerdote: a Consagração da Santa Missa. Pastorear o rebanho era o que lhe proporcionava maior prazer em toda sua vida. Preparava os temas para o sermão com todo o cuidado; não desejava tornar-se repetitivo. Gostava de causar interesse entre os fiéis, e gostava principalmente que eles participassem fazendo perguntas, expondo suas opiniões, e não apenas como ouvintes.
- Gosto que falem comigo durante o sermão. Quero saber o que pensam, o que os afligem e o que os faz tropeçarem – dissera ele em certa ocasião.
Há alguns anos, quando fora designado pároco da matriz de São Martinho , seus sermões vieram a ficar tão famosos por toda a região, que até mesmo os colonos das fazendas mais longínquas viajavam quilômetros para assistiram a missa aos domingos. Todos queriam casar-se ou batizarem seus filhos com ele, apesar da maioria das fazendas possuírem capelas para esses fins.
Com isso, a igreja tornou-se pequena para acomodar tantos paroquianos e tornou necessário um remanejamento nos horários das missas. Aos domingos eram celebradas quatro missas: três pela manhã e uma à tarde com duração de uma hora cada. Os casamentos e batizados aconteciam aos sábados, sendo aberta a exceção somente as chamadas “missas encomendadas”, como por exemplo, de sétimo dia e outras. No início fora difícil adaptar ao novo ritmo, contudo valera à pena. Sentia-se exausto nos finais de semana, mas ao mesmo tempo, com a confortante sensação de dever cumprido. Acalentava muitos sonhos, entre outros, a de construir uma nova paróquia maior. Um orfanato para crianças carentes, um abrigo para idosos, uma escola com centro recreativo, e muito mais. Entretanto, suas idéias nunca saíram do papel; ainda não realizara nada desde que ali chegara. Faltava interesse político e também dos fazendeiros que eram a maioria e os poderosos da região. Achava abominável a discrepância daquele lugar. Tinham lojas elegantes com artigos de luxo, ao qual só os endinheirados tinham acesso, e apenas uma escola pública num prédio velho e em completo abandono. Clubes privativos, com hipismo e outros esportes elegantes, mas nenhum campo de futebol ou centro esportivo mantido pela prefeitura. Possuía, também, uma bem montada clínica médica particular, mas quanto ao pequeno hospital municipal, as obras estavam paradas a mais de cinco anos. Em São Martinho só havia duas classes de pessoas: os ricos e os pobres. Os ricos ficavam cada vez mais ricos, e os pobres... Bem, esses eram mantidos no mesmo patamar com salários baixíssimos. De outra forma como poderiam servir aos ricos?
Frei Henrique ajeitou o colarinho de sua batina diante do espelho. Repassou na memória o tema do discurso daquele domingo; falaria sobre a família, sua estrutura e sua constituição. Estranhou o fato de Amadeu, um garoto de quinze anos que o auxiliava nas missas, ainda não ter vindo chamá-lo como era habitual. Talvez esteja adoentado – pensou – pedirei a uma das mulheres que me auxilie.
Consultou novamente o relógio: 06:57h. Estava na hora. Dirigiu-se para a passagem que ligava a casa à igreja, passou pela sacristia, apanhou sua bíblia e adentrou no salão.
A não ser por três mulheres acomodadas num dos bancos dos fundos, a igreja achava-se completamente vazia!
A principio, sua atitude foi de espanto, depois de estranheza. Olhou atentamente para as expressões nos rostos das mulheres e soube, de imediato, que algo sério estava acontecendo. Ele caminhou pelo corredor dos bancos em direção às mulheres:
- Onde estão todos? – perguntou.
- Não há mais ninguém além de nós. – respondeu uma das mulheres.
- Como assim?
- Viemos porque depois de muito pensar, chegamos a conclusão que não acreditamos em nada do que estão dizendo do senhor.
- E o que estão dizendo? – perguntou impaciente.
- O Frei ainda não viu o que está escrito do lado de fora da porta da paróquia? – perguntou a outra demonstrando espanto.
- Não...
Frei Henrique agora caminhava a passos largos em direção à saída da igreja, no que foi seguido pelas mulheres. Uma vez na calçada, fechou as duas folhas da pesada porta de madeira, e mal pode acreditar no que seus olhos viram. Com letras bem grandes de tinta branca, estava escrito: FORA COM PADRE ADÚLTERO!
Ele mesmo havia aberto aquela porta pela manhã, minutos antes de ir para a casa paroquial, aprontar-se. Nem de longe poderia imaginar aquilo!
- Mas o que significa isso? – perguntou irado.
- Todos estão dizendo que o senhor tem uma... uma...
- Fale de uma vez, pelo amor de Deus! – gritou ele.
- Deixa que eu falo – interveio outra mulher – Estão comentando por toda a cidade que o senhor tem uma amante... A tal costureira que veste calça e guia um furgão...
- Santo Deus!... Eu não posso acreditar que já... Que alguém tenha a coragem de inventar uma barbaridade dessa!... Vocês sabem quem começou com esses boatos?
As mulheres entreolharam-se sem nada responder.
- Vamos! Estou esperando!... De que lado vocês estão, afinal? – insistiu ele.
- Foi a Elvira – informou uma das mulheres.
- A protegida do prefeito – acrescentou a outra.
A decisão veio instantânea. Impulsivamente, ele ordenou às mulheres:
- Venham comigo!
Ele fez o trajeto de volta em direção ao altar. As mulheres seguiram-no sem nada entender
- Ajudem-me, por favor – pediu o Frei – Carreguem tudo, não esqueçam nada!
- O que o Frei está pretendendo? – perguntavam as mulheres atônitas.
- Vou montar o altar na praça! – anunciou ele – Se não vêm a mim, eu vou até eles... Não se livrarão tão fácil em me ouvir!
E sob os olhares curiosos dos transeuntes, os quatros trabalhavam na montagem do altar em meio à praça pública. Quando terminaram, o local estava completamente lotado de pessoas curiosas que certamente não caberiam dentro da pequena igreja!
E, mediante comentários, tais como: “o que está acontecendo aqui?” “Frei Henrique ficou doido!” – ele deu início ao seu sermão naquela manhã de domingo:
- O sermão de hoje será sobre um tema muito importante. Quero falar-lhes sobre a vocação para o sacerdócio.
Ele recuou-se um pouco para traz, procurava posicionar-se de tal maneira que toda a multidão, que se formara ao redor do altar, pudesse ouvi-lo:
- A vocação religiosa – retomou, ele – É aquele desejo forte que sentimos de servir a Deus, antes dos homens; mas é, também, um desejo de servir a comunidade de maneira geral: ensinando e confortando...
Renunciamos a ter uma vida convencional de cidadãos comuns, como por exemplo, possuir uma família com esposa e filhos... Nem sempre moramos nos lugares que escolhemos; rumamos para onde somos designados e tentamos fazer o melhor possível... Espantamos o medo inerente de uma solidão futura com a chegada da velhice... Abdicamos de nossas necessidades mais íntimas em prol do sacerdócio. Tudo fazemos com dedicação e alegria em nome da vocação, e acabamos incompreendidos... O que não ocorre a muitos, é que não somos semi-deuses com poderes extraordinários, ou máquinas programadas para funcionarem com precisão infalível. Não. Somos, antes de tudo, seres humanos... E temos anseios, dúvidas, medos e frustrações como qualquer um de vocês... E algumas vezes erramos na intenção de acertar, e aí sofremos; na maioria das vezes, choramos... E ninguém sabe... Ninguém vê... Temos que seguir adiante... Enxugar as próprias lágrimas e consolar os desconsolados...
Ele fez uma pausa. Já não falava para os ouvintes, falava para si mesmo. Podia-se ouvir o vôo de um inseto.
E sob os olhares efusivos dos presentes, ele continuou de improviso.
Alguns dias depois daquele domingo, Ingrid estacionou em frente ao MAGAZINE DE NOIVAS E MADRINHAS “RERQUINTE”. Carregava o último pacote para o interior da loja, e num impulso coloco-o em cima do balcão:
- Bom dia Anita, tudo bem por aqui?
- Tudo – disse a moça sem olhá-la – Mais uns minutos e já vou atendê-la.
A moça dobrou cuidadosamente algumas blusas, colocou-as na prateleira e voltou-se para Ingrid:
- Estão todos aqui? – perguntou ela.
- Estão. Todos revisados e conferidos – respondeu Ingrid – Precisa vê-los, ficaram lindos!...
- Eu imagino. Vou mandá-los para a conferência e em meia hora, no máximo, acertaremos as contas – disse a moça.
- Podemos tratar da próxima encomenda enquanto esperamos – sugeriu Ingrid – O que vai ser dessa vez?
Anita temia por esse momento. Desejou que tivessem designado outra pessoa para atendê-la.
- Ingrid... Não há outras encomendas... Eu sinto muito.
- Como assim?... Sempre há encomendas para mim e...
- Não, dessa vez.
- Mas, por que não?... Fiz algo errado?... Não estão gostando do meu trabalho?... Se for isso...
- Não é nada disso, Ingrid... é só que... – Anita buscava as palavras que não vinham – Olha, não sei ao certo, acredite... Só estou cumprindo ordens...
- Ordens de quem?... Não é você, a gerente? – perguntou elevando repentinamente o tom de voz.
- Ordens do dono da loja – informou Anita.
- Do dono?!... Mas ele nem me conhece!
- ...
- Anita... Há quantos anos nos conhecemos? – perguntou retomando o controle.
- Não sei... Três eu acho.
- Somos amigas, não somos?
- Claro que somos, Ingrid!
- Então?... Vai me contar o que está acontecendo? – insistiu.
- Não posso... perderia meu emprego...
Essa declaração desarmou Ingrid completamente; era o suficiente para fazê-la desistir de pressioná-la.
- Tudo bem. Tentarei descobrir de outra maneira – disse dirigindo-se à saída.
- Espere! – chamou Anita – O pagamento... Ainda não acertamos as contas.
- Fica para depois. Tenho outras lojas para visitar...
- Não vai adiantar ir à outras lojas – deixou escapar Anita.
Ingrid parou. Foi voltando lentamente em direção à moça:
- O que está querendo me dizer? – perguntou ela com ar desconfiado.
- Está certo! – rendeu-se a moça – Vai acabar sabendo de qualquer maneira. Eu vou lhe contar tudo que sei e seja o que Deus quiser!
- Não vou comprometê-la, se isso a tranquiliza – prometeu Ingrid.
Anita sinalizou para que Ingrid chegasse mais perto e em tom de segredo fez sua narrativa:
- Estão comentando por toda a cidade que você é amante do Frei Henrique.
- Santo Deus! – Ingrid sentiu-se empalidecer.
- ... Acho que é por causa dessa amizade de vocês. Eu não tenho nada a ver com isso, mas a cidade toda está fervendo em boatos... A Elvira, que é a protegida do prefeito...
- Claro!... O prefeito!...
- ... Andou comentando nas lojas, que quem lhe desse trabalho, o prefeito negaria todo e qualquer apoio... E você sabe que a maioria dos proprietários lojistas, são fazendeiros que gozam de certos privilégios... Todo mundo sabe que o prefeito faz vista grossa para a sonegação de impostos e tudo mais... Ninguém está querendo arriscar a pele. Foi por isso que eu disse que não adiantaria ir às outras lojas.
- É inacreditável o que está me contando!... Por que estão fazendo isso comigo?
- Não é somente com você... Ainda não sabe o que fizeram ao Frei.
Ingrid sentiu uma pontada no peito. Não aguentaria ser a causadora de algum mal a ele.
- O que fizeram à ele?
- Escreveram na porta da Igreja com letras bem grandes: “Fora com Padre adúltero!”. E no domingo passado, não havia ninguém para assistir a missa.
- Acreditaram nesses boatos nojentos... Como puderam?
- Ah, mas espere só eu te contar a saída triunfal que o Frei arrumou! – exclamou Anita excitada – Ele montou o altar em plena praça e celebrou a missa ali mesmo... Enquanto fazia o sermão, foi juntando gente até não poder mais. E todos foram ficando, ficando... E quando menos se esperou, todos estavam participando da missa como se estivessem dentro da Igreja... Até cantaram no final!
- E depois?
- Bem, quando tudo terminou, as opiniões divergiram, mas a grande maioria deixou de acreditar nos boatos... Pelo menos foi o que me disseram – concluiu Anita.
- Menos mal. Obrigada por ter me contado, mas agora tenho que ir – disse e saiu apressadamente.
- Aonde vai?
- Vou mergulhar de cabeça na boca do lobo.
- Não acertamos as contas...
- Fica para outro dia.
- Espere!
- Fique tranqüila – gritou Ingrid de dentro do furgão – Não quebrarei a promessa que lhe fiz.
Ela ligou o motor e saiu em disparada. Por onde passava, as pessoas apontavam-na e cutucavam umas as outras. Ingrid pisou mais fundo no acelerador como numa fuga frenética até chegar ao seu destino: A prefeitura.
Parou numa freada brusca, saltou do veículo num só pulo, nem ao menos fechou a porta. Subiu as escadarias correndo. Passou por Honório feito relâmpago. Estourou feito bomba no gabinete do prefeito.
- Hei! Não pode entrar aí assim! – protestou Honório seguindo-a, mas ela já estava frente a frente ao prefeito.
- Pode deixar Honório. Eu atendo a moça apressadinha – disse o prefeito em tom de deboche – Feche a porta, por favor.
Ingrid estava ofegante, com os dois punhos cerrados sobre a luxuosa escrivaninha. Ele sorriu com exagerada cordialidade:
- Não quer se sentar? – perguntou.
- Não será necessário – recusou secamente – O que eu tenho a dizer-lhe não levará mais do que uns poucos minutos.
- Não aceita nem mesmo um café, uma água... Ou prefere um chá?
- Dispenso sua cortesia – disse sarcástica – Vim lhe dizer que pode fazer o que bem entender comigo, eu não me importo. Não conseguirá me atingir... Nada do que fizer será pior do que já passei... Mas deixe o Frei fora dessa sujeira! – gritou, ela.
- Quem diria!... Então o padreco arrumou uma advogada de defesa!...
- O senhor não me conhece!... Não avalia do que sou capaz! – disse ela, fora de si.
O prefeito levantou-se bruscamente e esmurrou a mesa com violência:
- Como ousa me fazer ameaças? Caso não saiba, senhorita, sou autoridade máxima nessa cidade! Possuo patente militar e posso mandar prendê-la por desacato...
- Eu não faria isso se fosse o senhor – interrompeu-o numa afronta – A menos que queira uma cidade inteira na sua porta desacatando-o!... Será que há lugares suficientes em sua cadeia? – concluiu irônica.
- Não me obrigue a colocá-la a força fora daqui...
- Não será necessário. Já disse tudo que queria – disse ela dirigindo-se à saída. Mas voltou-se para encará-lo.
- Ah!... Ia me esquecendo. Obrigada pelo médico maravilhoso que o senhor nos enviou... É mesmo uma pena que o senhor dê com uma mão e tire com outra.
Dizendo essas palavras, ela saiu batendo fortemente a porta atrás de si.
- Sua vaca ordinária! Você vai me pagar... Ah, se vai!
No trajeto de volta à Redentor, Ingrid guiava mecanicamente. Por duas vezes, quase saiu fora da pista. Turbilhões de pensamentos entravam e saiam de sua mente, todos de uma só vez. Ao longe avistou um bosque de eucaliptos e decidiu parar e caminhar um pouco para relaxar.
Pensava em Leopoldo. Ficara tão feliz com sua chegada, e agora, colocara tudo a perder. Não duvido em nada que ele o chame de volta só para punir-me – pensava, ela.
A brisa suave e o perfume das árvores, aos poucos foram acalmando-a. Numa manobra espetacula, um Falcão Peregrino arrebatou uma presa em pleno ar. Era a luta pela sobrevivência.
Ela suspirou profundamente. Sentia-se pronta para retomar o caminho.
Bia,passei para agradecer suas visitas e saber se está tudo bem com a revisão do livro.Bjs e boa sorte!
ResponderExcluirOlá,
ResponderExcluirTenha uma SURPREENDENTE E MARAVILHOSA primavera!!!
Excelente fim de semana!!!
Hoje ofereci a VOCÊ uma música especial... por seguir-me.
Abraços fraternais
Boa sorte com o livro!!!
Com um pouco de demora, vim dar continuidade à leitura...
ResponderExcluirMais uma vez, parabéns...
Prezada Bia; é tanto suspense que a gente prende a respiração.
ResponderExcluirEstamos atentos e torcendo na saga de Ingrid.
Grande abraço,
Adh
Já fazia umtempo que eu não andava por aqui por falta de tempo, mas essa história quero saber tooda...
ResponderExcluira cada capítulo aumanta o suspense e me dá mais vontade de ler o próximo!!
beijos